Pós-capitalismo na era do algoritmo

 

 

Cédric Durand e Razmig Keucheyan (*)

 

 

Ao fim do século XX, quando o bloco soviético caiu, a questão do planejamento econômico parecia resolvida de uma vez por todas. Na oposição entre o mercado e o plano, o mercado havia conquistado uma vitória decisiva. Quaisquer que sejam as modalidades particulares de sua implementação na URSS, Iugoslávia, Hungria, Alemanha Oriental ou China – as variantes foram muitas –, o planejamento não conseguiu constituir uma alternativa sustentável e credível. Mas trinta anos depois da queda do muro de Berlim, uma coisa é clara: o planejamento não é um assunto secreto. Nos quatro cantos do mundo, os debates que o preocupam estão ganhando impulso, tanto no campo acadêmico quanto no campo política. Em fevereiro de 2018, uma conferência de três dias em Auckland, Nova Zelândia, a convite de sindicatos e um centro de pesquisa, foi intitulada “O retorno do planejamento econômico”. A chamada para obter contribuições declara:

 

“Nas atividades econômicas atuais, há um crescimento notável do planejamento: em termos de estratégias implementadas, a proliferação de técnicas de gerenciamento de risco, sistemas de informação ou no campo dos serviços de entrega e da logística. O planejamento econômico tornou-se uma norma no capitalismo contemporâneo. A questão, portanto, não é mais planejar ou não as atividades economicas, mas como e para quais propósitos” (1).

 

Em setembro de 2017, o Financial Times publicou uma matéria: “A revolução do Big Data pode ressuscitar a economia planejada” [The Big Data revolution can revive the planned economy]. Aos olhos de um de seus editorialistas, as possibilidades computacionais oferecidas pelo Big Data e pelos algoritmos sugerem que algumas falhas do planejamento central do século XX poderão ser superadas no futuro (2).

 

O retorno da planificação

 

Vários motivos levam à reabertura desta temática.

 

Primeiro, a crise do capitalismo, aquela que irrompe em 2008 e na qual ainda nos encontramos. Essa crise não só demonstrou, mais uma vez, a irracionalidade do mercado ou, mais fundamentalmente, o que Marx chama de “anarquia da produção”. Mas as tentativas de resolvê-la dependeram da maciça intervenção do Estado. Nestas condições, a vitória do mercado “livre e não distorcido” parece menos marcante. Planejar, é claro, é algo além da intervenção simples – e até maciça – dos Estados nos processos econômicos e financeiros. Implica uma forma de controle político sobre a produção, e não apenas a regulamentação ex-post das trocas mercantis. Esse controle pode ser mais ou menos democrático, mais ou menos centralizado e mais ou menos automatizado. Mas é ex-ante, embora seja acompanhado por revisões periódicas das previsões do plano.

 

Em segundo lugar, novos desafios estimulam o repensar do planejamento. Um deles é a transição ecológica. No campo ambiental, muitas pessoas fazem planejamento sem saber que o fazem ou sem usar o termo. É desenvolvendo cenários ecológicos que os especialistas em energética trabalham atualmente neste campo. A “Associação negaWatt” desenvolve alguns dos modelos de sustentabilidade mais influentes na França (3). Fundado em 2001, este grupo de engenheiros diz:

 

“Um cenário energético é a tradução em figuras de uma certa visão do futuro, a representação de um futuro tão viável quanto possível, uma ferramenta para refletir sobre as prioridades, os ritmos, a coerência das orientações de uma estratégia de energia sustentável” (4).

 

O planejamento não pode ser definido de modo melhor. Um “cenário” refere-se a uma visão do futuro baseada em prioridades quantitativas, que é obrigatória para os atores econômicos. Tem uma coerência global, fruto de uma deliberação democrática, em que os “especialistas” alimentam os debates. Um cenário permite projetar a longo prazo, abandonando, assim, a “visão de curto prazo” do mercado. O cenário “Negawatt” diz como o aparelho produtivo deve evoluir para atingir a meta de “emissões zero” até 2050. Transporte, agricultura, construção e energia são objetos de cenários que são então mesclados em um “roteiro”.

 

Esses cenários de transição ecológica têm duas características. Em primeiro lugar, seu ponto focal é o setor de energia:

 

“A temporalidade da energia é o longo prazo: grande parte da infraestrutura e da organização econômica e social que estamos construindo hoje vão determinar a produção e o consumo de energia na segunda metade deste século” (5).

 

Essa centralidade da energia decorre do fato de que a mudança climática é consequência dos gastos insustentáveis nesse campo. As experiências de planejamento do século XX visavam o crescimento da produção, não a diminuição do consumo de energia, daí seu caráter “produtivista”. São resultados de uma visão de planejamento que procurava, muitas vezes, o alçar de economias atrasadas em relação às economias capitalistas avançadas. No caso da transição energética, o foco é colocado na restrição no uso de insumos e, mais amplamente, na interação com o metabolismo do planeta.

 

O controle da energia e da infraestrutura no longo prazo terá impacto na atividade econômica em geral. O sistema energético em vigor em uma sociedade determina o tipo de bens produzidos, bem como as modalidades de sua circulação. Alguns economistas ecológicos desenvolveram uma teoria do “valor-energia (6)“. Todas as mercadorias contêm um quantum de energia (do qual o trabalho humano é uma das modalidades), que deve ser reduzido como parte da transição energética.

 

Em segundo lugar, os cenários ecológicos são baseados em uma representação física, não econômica, da economia e de sua evolução. Indicadores econômicos – tais como preço, crescimento, renda, inflação, valorização do mercado… – mentem do seu ponto de vista. O desperdício de energia, por exemplo, aumenta o PIB. Eles estão baseados na ideia, anterior à consciência ecológica, de que o desenvolvimento da economia não está limitado por recursos finitos. Não contemplam a ideia de limite natural do crescimento. Pensar em termos de energia, área agrícola, CO², materiais, biomassa… permite integrar essa restrição e superar as aporias da hipótese de “substitutibilidade”. Segundo esta hipótese, o investimento em capital humano, equipamentos e infraestrutura poderia compensar o esgotamento dos recursos naturais (7).

 

À sua maneira, os especialistas da transição ecológica encontram, assim, uma intuição fundadora da “crítica da economia política” de Marx. Partindo de sua crítica ao fetichismo das mercadorias, este autor visa subverter as categorias pelas quais a economia clássica representava os processos econômicos. Essa crítica abre o caminho para um projeto econômico radicalmente diferente. Os fracassos no planejamento soviético e suas variantes, no entanto, revelaram grosseiramente seu caráter fragmentário.

 

O projeto de Marx e a planificação soviética

 

O comunismo imaginado por Marx e Engels se opõe à economia capitalista na medida em que não envolve nem mercadoria, nem trabalho assalariado. Trata-se de superar, por meio da cooperação, a divisão em classes que separa os produtores dos meios de produção e a divisão do mercado que separa os produtores de seus produtos. O primeiro ponto é atingido por meio da expropriação dos proprietários capitalistas e a socialização dos meios de produção. O segundo, pelo planejamento, que deve superar o mercado como mecanismo dominante de coordenação.

 

Para Marx, o papel do planejamento é assegurar que “as relações sociais existentes entre os seres humanos e seu trabalho e entre os seres humanos e o produto de seus trabalhos se tornem algo simples e transparente, tanto na produção quanto na distribuição” (8). Engels diz que “as utilidades dos vários objetos de uso, tomadas em si mesmas e em relação às quantidades de trabalho necessárias para sua produção, determinarão o plano” (9). O cálculo econômico comunista deve, portanto, lidar com dois elementos: por um lado, com “os efeitos úteis”, isto é, o valor de uso dos diferentes produtos usados que o plano se propõe a realizar; por outro lado, os recursos necessários para sua produção – ou seja, as quantidades de trabalho, os meios de produção em sentido amplo, sejam máquinas, edifícios, produtos intermediários ou recursos naturais.

 

O planejamento deve ocorrer sem o uso do dinheiro. Por meio do plano, a atividade econômica passa a ter um caráter diretamente social, que permite à sociedade, plenamente consciente de si e de seus recursos e capacidades, satisfazer as suas necessidades. Desembaraçada da fragmentação dos trabalhos privados e do fetichismo das mercadorias, aliviadas do risco de superprodução inerente à produção mercantil, as relações entre os seres humanos na produção tornam-se transparentes. Eles entram em acordo a priori sobre o que e quanto produzir, o que permite a Engels esperar que “as pessoas resolvam tudo de maneira muito simples sem a intervenção do famoso “valor”.

 

É com este roteiro em mente que, no início da década de 1920, os economistas soviéticos previam a construção de um sistema de produção totalmente planejado, sem dinheiro e, portanto, sem preço, onde tudo seria calculado com precisão e distribuído de acordo com a necessidade (10). Este projeto nunca chegou a ver a luz do dia. No rescaldo de batalhas políticas e de terríveis transtornos, surgiu um modelo de planejamento imperativo. Desde o primeiro plano stalinista de cinco anos, de 1928, até a dissolução do Gosplan, em abril de 1991, esse sistema se constituiu como um modo de organização da atividade econômica alternativo ao capitalismo ocidental.

 

Para bem apreciar esta experiência histórica, é preciso se guardar de qualquer ilusão retrospectiva e, em particular, evitar postular sua inescapável vocação para ficar para trás diante de seu oponente na Guerra Fria. Assim, no início dos anos 1960, o slogan soviético “Alcançando e ultrapassando os países mais avançados!” parecia plausível. Raymond Aron, em suas dezoito lições sobre a sociedade industrial (1962), considerou possível a superação da produção industrial dos Estados Unidos pela da URSS (11). Até a edição de 1989, Economics, o famoso livro didático de Paul Samuelson, afirmava:

 

“A economia soviética é a prova de que, ao contrário do que muitos céticos anteriormente acreditavam, uma economia de comando socialista pode funcionar e até mesmo prosperar” (12).

 

No meio século entre a revolução de outubro e o final dos anos 1960, o sistema soviético transformou uma sociedade rural e fracamente industrializada herdada do império czarista, construindo um país predominantemente urbano com um os melhores sistemas educativos e com um dos mais poderosos dispositivos industriais (13). Este impressionante sucesso econômico – somente o Japão fez melhor em termos de produto interno per capita durante este período (14) – foi alcançado apesar, mas também ao custo, de dezenas de milhões de mortes durante a guerra civil pós-revolução, fomes provocadas por coletivizações forçadas, terror stalinista, guerra total contra o nazismo e imensa destruição ambiental.

 

A partir dos anos 1970, o modelo chegou ao limite, com o surgimento de uma série de sintomas de que entrava em crise: declínio das taxas de crescimento da renda nacional, inflação, dívida externa, insatisfação quantitativa e qualitativa da demanda por bens de consumo (15).

 

A tripla falha

 

O planejamento soviético possibilitou o desenvolvimento industrial e demonstrou a viabilidade do planejamento econômico em larga escala. Mas a lacuna entre o sistema implantado e o projeto marxiano mostrou-se considerável, o que permite diagnosticar um triplo fracasso da experiência soviética em relação às suas ambições iniciais.

 

Primeiro, o processo de implementação do plano era muito caótico. O cálculo econômico no interior do plano deriva das prioridades decididas ao nível central. Apoiava-se em padrões de produção e de consumo, bem como de um sistema de balanços materiais destinado a equilibrar, durante um certo período, os recursos com as necessidades de um dado produto ou, em um nível mais agregado, um tipo de produção (16). No entanto, ao longo de sua existência, o planejamento soviético caracterizou-se por apresentar discrepâncias significativas entre as previsões e os resultados, as quais eram fontes de enormes desperdícios, requerendo incessante ajustes e acordos informais entre as empresas.

 

Neste contexto – e esta é uma segunda falha –, os preços não funcionavam apenas como unidades de conta para organizar a produção, mas desempenhavam também um papel na alocação de recursos. O nível dos preços era estabelecido durante uma barganha burocrática vertical (17). Daí a necessidade de acumular dinheiro de tal modo que este passava a ser procurado por si mesmo, tanto por famílias quanto por empresas (18). De fato, o seu uso não se constituía apenas num exercício formal de contabilidade, mas se tornava uma condição para o comércio na economia legal – era o único meio de pagamento – e ainda mais no contexto da economia paralela. Em suma, o dinheiro continuou ativo e influenciava o comportamento dos agentes econômicos. Essa influência atesta a persistência de formas latentes de competição de mercado e a fragmentação dos processos de trabalho, o que impedia que as relações econômicas se tornassem transparentes (19).

 

Terceiro fracasso: longe de alcançar a abundância, a escassez tornou-se o princípio regulador das economias planejadas. Isso não refletia apenas a disfunção estrutural na alocação de produtos, mas também, à medida que as aspirações para o consumismo eram reforçadas, a incapacidade de estabelecer normas culturais alternativas de consumo em relação às dos países ocidentais. O caráter autoritário – em certos períodos “totalitários” – do partido-Estado soviético aparece aqui. No nível econômico, resultava na perpetuação de uma separação vertical dos produtores dos meios de produção; no contexto da guerra fria, o investimento voltava-se para uma preferência por despesas militares em detrimento da produção de bens de consumo. Sem democracia, a burocracia soviética entrou em confronto militar e produtivista com o Ocidente, sem conseguir a legitimidade do projeto soviético para a satisfação das necessidades da população.

 

A informatização da vida econômica

 

Outro modo de planejamento poderia ter surgido e se consolidado na URSS graças à tecnologia da informação? Nos anos 1950 e 1960, os economistas e cientistas da computação soviéticos desenvolveram projetos de “gerenciamento econômico automático” e “planejamento ótimo”. Estes prometiam reduzir as disfunções do plano em termos de desperdício, desvio de produção, redundâncias burocráticas, perda de informação (20). Infelizmente, esses programas nunca foram experimentados, pois colidiam com os limites da capacidade de computação da época e com a hostilidade dos burocratas cujas prerrogativas ameaçavam (21).

 

O mesmo desejo de criar um planejamento cibernético pode ser encontrado no projeto “Cybersyn”, lançado no Chile após a vitória de Salvador Allende, em 1970 (22). Os primeiros esboços então inventados visavam combinar o gerenciamento em tempo real do planejamento centralizado e o envolvimento dos trabalhadores por meio da autogestão. O experimento foi interrompido pelo golpe militar de Augusto Pinochet. Em ambos os casos, essas tentativas fracassadas ocorreram em um contexto em que o desenvolvimento de computadores estava ainda engatinhando.

 

Hoje, a possibilidade de planejamento centralizado assistido por computador é muito mais viável do que cinco ou sete décadas atrás. Sistemas de informação sofisticados e altamente automatizados trabalham todos os dias para administrar as economias atuais; eles atuam como ferramentas para planejamento industrial e comercial e gestão de políticas públicas.

 

Desde a década de 1990, o Enterprise Resource Planning (ERP), um sistema integrado, tornou-se uma ferramenta indispensável que oferece aos gerentes uma visão panóptica e coerente das atividades da empresa e reforça as capacidades de controle em tempo real. Por exemplo, quando uma empresa decide se instalar no exterior, planeja seus objetivos de desenvolvimento ao longo de vários anos e projeta indicadores cuja evolução é seguida dia a dia com o fim de descobrir ações corretivas assim que necessárias.

 

O conceito de esfera de negócios, implementado na Procter and Gamble desde o início da década de 2010, ilustra a centralidade dos sistemas de informação na renovação das práticas de gestão topográficas:

 

Tecnologicamente, trata-se de uma sala esférica equipada com telas gigantes, onde as informações gerenciais são exibidas na forma de gráficos para revisão, processamento e tomada de decisão. […] As esferas de negócios são gerencialmente similares aos espaços de reuniões interconectados e interativos ao redor do mundo cujo propósito é fornecer uma visualização fácil de dados massivos. […] O modelo de esfera de negócios conta com ferramentas de previsão particularmente sofisticadas relativas ao mercado (e suas evoluções) e outros parâmetros-chave do desempenho da empresa nos mercados. Com base nessas previsões, a empresa pode ajustar os preços instantaneamente, mas também os investimentos em publicidade, na capacidade industrial e logística etc., o que permite que ela se adapte rapidamente às mudanças nos mercados (23).

 

O design futurista da esfera de negócios lembra a sala de comando imaginada no projeto Cybers. Ambos os sistemas se baseiam na ideia de que a centralização dos dados permite otimizar as previsões e, como resultado, ajustar em tempo real o plano econômico – seja ele privado ou público – de acordo com os acontecimentos imprevistos.

 

Esse monitoramento em tempo real da realização dos planos também se reflete nos contratos de serviços plurianuais das grandes empresas de TI. São estabelecidos objetivos pormenorizados em termos de volume e qualidade dos serviços prestados ao longo de todo o período de vigência do contrato e por sub-períodos; a sua monitorização é efetuada em tempo real, dando origem a ações corretivas e, se necessário, penalidades. O problema cibernético relativo às interações retrocedentes entre o plano e a sua realização, agora que o imediatismo do monitoramento se tornou regra, tornou-se radicalmente diferente. Assim são melhoradas as possibilidades de otimizar a alocação de recursos de acordo com objetivos pré-definidos e adaptar o plano a erros, desvios e eventos inesperados à medida em que ocorrem.

 

Conectividade permanente

 

A Procter and Gamble é uma empresa entre milhões de outras. Seu sistema interno, além disso, é hierárquico: os funcionários e os clientes não têm voz nas decisões tomadas pela administração. Como passar do planejamento de negócios para o de uma economia como um todo, ademais com base em procedimentos democráticos? A questão permanece sem solução. No entanto, a explosão da capacidade de coleta e de processamento de dados tornou possível a conectividade permanente, o que levanta a questão da transparência das relações econômicas.

 

O monitoramento digital em tempo real dos processos de produção e transações econômicas não está mais confinado ao nível corporativo. Estende-se além das cadeias de valor, onde as tarefas executadas em diferentes entidades são combinadas para produzir produtos acabados. Os dados digitais permitem o gerenciamento centralizado de cadeias de valor cada vez mais complexas e demoradas. Esta é uma das razões pelas quais os dados de propriedade intelectual são uma questão central hoje.

 

Por exemplo, como parte do programa “Indústria 4.0” iniciado pelo governo alemão, os fabricantes começaram a implantar sistemas cibernéticos (físicos) que combinam sensores conectados (“internet das coisas”), tecnologias de computação em nuvem e algoritmos de computador, processamento de dados, para que “as partes digitais do quebra-cabeças da cadeia de suprimentos se unam de uma maneira que permita um gerenciamento mais holístico e em tempo real de todo o ecossistema” (24). Esse tipo de integração implica uma circulação muito densa de informações com características técnicas, o que dota o sistema de preços de um rico substrato informacional.

 

Outras tecnologias, tal como o blockchain, estão mudando a maneira como a confiança e a segurança podem ser implantadas em um sistema econômico. Elas garantem a integridade de um sistema de transações entre indivíduos ou entidades dispersas sem a necessidade de passar por um controle hierárquico. Usada inicialmente para o desenvolvimento de moedas eletrônicas, essa tecnologia agora também suporta o desenvolvimento de sistemas de contabilidade. Segundo a Deloitte, essa inovação poderia favorecer a ampliação das redes das trocas mercantis (25).

 

Devido à sua natureza descentralizada, essa tecnologia também é implantada por vários atores públicos e privados para garantir a transparência do comércio marítimo, para rastrear a origem dos diamantes ou para garantir a proveniência dos produtos da pesca, ademais, para manter a integridade das cadeias marítimas refrigeradas para produtos farmacêuticos (26). Torna-se, assim, possível destacar o que as trocas de mercado não revelam por si mesmas, algo que ecoa a aspiração por uma transparência das relações sociais e que foi buscado pelos primeiros teóricos da planificação. De imediato, essas tecnologias são usadas para automatizar certas tarefas, como procedimentos alfandegários no caso do comércio marítimo ou a destruição de produtos em caso de quebra da cadeia de refrigeração. No que diz respeito ao objeto deste artigo, ilustra a possibilidade de uma coordenação descentralizada não mercantil, baseada em princípios preestabelecidos. As decisões econômicas não são tomadas de acordo com as características intrínsecas e observáveis dos produtos, mas com a história sociotécnica das mercadorias em questão.

 

Os instrumentos da indústria 4.0 e do blockchain de produtos não financeiros mostram que os sistemas de informação contemporâneos desenvolvem capacidades para coordenar as interações econômicas entre pessoas dispersas sem o emprego do liame monetário. Eles contornam, portanto, certamente de maneira localizada, o fetichismo das mercadorias.

 

Rastreando o futuro nos traços digitais

 

Outro desenvolvimento recente consiste nos sistemas de informação que contêm capacidades antecipatórias. Esse é, por exemplo, o caso da “manutenção preditiva”, em que se mobilizam grandes dados sobre ocorrências anteriores. Por meio de sensores colocados nos equipamentos industriais que dão sinais de desgastes, é possível desencadear intervenções preventivas antes que as peças enfraquecidas causem falhas. Da mesma forma, os traços digitais deixados por nossas atividades on-line permitem que as plataformas antecipem nossas expectativas com base em nosso comportamento passado. Por exemplo, se você comprou um livro de Marc Lévy na Amazon, durante a sua próxima visita ao site, o algoritmo oferecerá um Guillaume Musso similar mas não Marcel Proust. Isso dá ao indivíduo comprador um apoio à sua decisão, permitindo, no nível agregado, uma otimização dos processos logísticos. Eis que reduz drasticamente a necessidade de armazenamentos e, consequentemente, os riscos de má alocação de recursos (27).

 

Dominique Cardon chama esses tipos de usos dos algoritmos de “behaviorismo radical”: eles reenviam permanentemente ao consumidor a imagem de seu consumo passado (28) e retornam aos equipamentos industriais as regularidades anteriormente observadas. A priori, não se vê como a centralização das informações passadas por tais plataformas poderia fomentar a inovação ou antecipar as necessidades futuras; pois, os consumidores e usuários não têm muitas vezes ideia do precisam mais a frente. A inovação é, por definição, orientada para o futuro, tendo assim, também, uma natureza dialógica e estocástica.

 

De qualquer modo, as capacidades de inovação estão cada vez mais associadas ao controle e ao gerenciamento de dados. O CEO da Siemens, Joe Kaiser, disse que se está na presença do “santo graal da inovação” (29). Com os avanços no aprendizado de máquina, o acúmulo de dados é cada vez mais visto como um pré-requisito para o processo de inovação. O Big Data abre a possibilidade de resolver problemas que vão além das questões simples de otimização. Ao identificar padrões, eles sugerem relações ainda não identificadas que, embora não sejam inovações enquanto tais, ajudam a orientar a pesquisa e o desenvolvimento.

 

Assim, para promover a inovação, o Wal-Mart usa um software chamado HANA que, segundo o escritório de informação dessa empresa, “flutua acima de seu sistema de gestão integral”. Dados fornecidos pelos 245 milhões de clientes, fluentes à taxa de 1 milhão de transações por hora, dados fornecidos pelos 17.500 fornecedores da empresa, dados gerados pela atividade interna do empreendimento relativos a um número enorme de transações, dados externos (sobre clima, redes sociais, indicadores econômicos, etc.) constituem uma enorme mina em que analistas pesquisam para enfrentar problemas que os diversos demandantes lhes propõe para resolver. Essa montanha de dados revela soluções das quais os analistas não tinham qualquer intuição prévia (30).

 

Até que ponto esses dispositivos são ferramentas eficazes para a inovação? Difícil responder na ausência de estudos sobre o assunto. A suposição de que o big data ajuda a identificar os principais problemas e, portanto, contribui para ter uma vantagem competitiva em termos de inovação, está no centro das práticas de negócios e das preocupações dos reguladores. É o que diz Margarete Vestager, comissária europeia para a promoção da concorrência, para explicar por que abriu uma investigação sobre a Amazon no outono de 2018:

 

A Sra. Vestager informa que a sua pergunta diz respeito aos dados: vocês – ela questiona – também usam esses dados para fazer as suas próprias previsões, para estimar qual será a próximo evento importante, o que as pessoas querem, que tipos de ofertas eles querem receber, o que os leva a comprar mercadorias? (31)

 

A questão visava saber se a Amazon se beneficiava do acúmulo de dados de vendas de terceiros em sua plataforma. Mas a suposição mais ampla era de que o controle desses dados alimentava a inovação. No caso das empresas capitalistas, o critério decisivo imposto aos algoritmos é sempre a obtenção de lucros; porém, se neles fossem incrustados outros parâmetros sociais relevantes, eles poderiam facilitar o funcionamento de uma economia planejada.

 

Planificar por meio dos algoritmos

 

Otimização, interações não monetárias, antecipação, inovação: os sistemas de informação tocam cada uma dessas dimensões-chaves da coordenação econômica. Quais são as consequências dessa nova ferramenta informacional para a construção de projetos de planejamento? Em que medida mudaram os termos do debate clássico sobre o cálculo econômico socialista?

 

Duas posições se confrontam a esse respeito. Alguns, na esteira da escola austríaca de von Mises e Hayek, colocam ênfase na persistência de problemas decorrentes da natureza tácita e dispersa do conhecimento. Se assim for, seria impossível que um processo de planejamento centralizado pudesse a criar uma dinâmica de aprendizagem coletiva dotada, ademais, de satisfatória criatividade (32). Para outros, pelo contrário, as mudanças tecnológicas mudaram os termos do debate, uma vez que derrubaram uma das principais objeções ao planejamento. E esta dizia respeito à impossibilidade de realizar os cálculos necessários para a operação do plano centralizado.

 

O debate, agora, centra-se em três questões principais. A primeira diz respeito à coleta de informações relevantes, a segunda se refere à otimização, ou seja, ao processamento das informações e à capacidade de arbitrar de modo consistente levando em conta o custo de oportunidade, dado um conjunto de restrições e de preferências. A terceira aponta para a inovação, para a incerteza e para a transformação qualitativa da sociedade à medida que as forças produtivas e as mudanças culturais, sociais e políticas se desenvolvem.

 

Se as informações relevantes puderem ser reunidas, as tecnologias de informática disponíveis permitirão otimizar a alocação de recursos em um dado momento e, em particular, ajustar o plano inicial em tempo real, dependendo dos desenvolvimentos observados. Esse é um ponto importante se lembrarmos, por exemplo, que Lionel Robbins considerou, nos anos 1930, que uma solução matemática para o problema da alocação racional de recursos era concebível no papel, mas que, na prática, essa solução era inatingível: Isso exigiria a escrita de milhões de equações baseadas em milhões de dados estatísticos baseados em ainda mais milhões de cálculos individuais. No momento em que as equações forem resolvidas, as informações nas quais elas se baseiam se tornarão obsoletas e precisarão ser calculadas novamente (33).

 

O mesmo argumento concernente aos limites das capacidades de cálculo foi decisivo nos anos 1960, pois foi usado contra o projeto do economista ucraniano Glushkov que previa uma planificação integral da economia soviética, a qual, portanto, dispensava o uso do dinheiro. O tempo de cálculo foi avaliado em muitas centenas de milhões de anos (34).

 

Atualmente, entretanto, mesmo considerando que a complexificação das economias implique numa multiplicação dos dados a serem levados em conta e mesmo que se saiba que mobilizar o poder computacional tem um custo energético e que este é ecologicamente significativo, julga-se que os avanços feitos na computação permitem obter de forma centralizada uma possível alocação ótima de recursos . Essa hipótese foi já considerada por Alin Cottrell e Paul Cockshott; eles imaginaram um sistema de planejamento baseado na contabilidade no tempo de trabalho e guiado pela informação revelada pelas escolhas dos consumidores ao usarem os seus certificados de tempo de trabalho não transferíveis para a compra de bens de consumo (35).

 

Os argumentos contra este modelo não dizem respeito a dificuldades de cálculo. Eles se concentram na disponibilidade de dados relevantes para desenvolver o plano e possibilitar a inovação (36). A questão fundamental, levantada por Hayek, diz respeito ao conhecimento necessário ao funcionamento do sistema: este é sempre disperso, tácito e inacessível. Assim, o saber mobilizado pelos agentes econômicos em suas decisões econômicas, seja como produtores seja como consumidores, não se encontra incorporado em dados. O ajuste do preço de mercado tanto expressa como produz esse conhecimento, o qual é irredutível a qualquer forma de codificação. Ora isto, ao mesmo tempo, implica na impossibilidade de um planejamento racional.

 

Sem entrar nos detalhes dessa discussão essencial, mas complexa demais para ser detalhada aqui, vamos primeiro notar que a crítica marxista do fetichismo da mercadoria lida precisamente com a incapacidade do sistema de preços de dar conta de informações relevantes, as quais se referem tanto às necessidades que precisam ser satisfeitas quanto às condições de produção que as atendem. Qualquer discussão sobre as dificuldades cognitivas do plano deve, portanto, espelhar de algum modo esse problema do fetichismo. Note-se que há reminiscências dele no contexto da economia padrão por meio das noções de externalidades e de falhas de mercado.

 

Deste ponto de vista, a possibilidade de conceber e de integrar uma pluralidade de indicadores no quadro do cálculo econômico que alimenta o plano de produção, estabelecendo depois uma hierarquia de restrições, pode aparecer como uma vantagem vis-à-vis o caráter unidimensional da informação monetária veiculada pelo mercado. É precisamente isso que os “cenários” de transição ecológica tentam fazer; eis que usam indicadores desse tipo para representar e planejar o atendimento das necessidades reais.

 

Uma segunda objeção diz respeito à ideia de que os agentes não sabem as suas preferências antes de interagir no mercado. Atendo-se à big data e ao desenvolvimento do poder preditivo que ela permite, essa hipótese deve ser matizada. A maioria das decisões econômicas individuais de consumo ou investimento é previsível, pelo menos redutível a uma variedade limitada de opções com regularidade facilmente sintetizáveis em um nível de agregação mais alto. A incerteza radical está, portanto, confinada a um domínio decisivo, mas limitado, correspondendo ao investimento e à difusão de inovações.

 

O último elemento diz respeito ao que a crítica do plano ignora. Ele é cego para o tipo de conhecimento dialógico que pode emergir do próprio processo de planejamento. Ao estabelecer prioridades coletivas, ele cria um contexto para a expressão de preferências econômicas. Como as preferências não são independentes do contexto (37), esse quadro de expressão traz à tona um tipo de conhecimento inacessível aos processos de mercado, que pode ser associado à ideia de uma forma mais elevada de consciência da sociedade em questão à si mesma – a qual, aliás, Marx previu a vinda. O grande número é mais inteligente do que o pequeno número: esse princípio é geralmente aceito em questões políticas, para justificar a superioridade epistêmica da democracia sobre outros regimes políticos (38). Não há razão para que não seja assim no campo econômico.

 

Contra todas as expectativas, os algoritmos podem ser socialistas. Assim como Engels afirma no Anti-Dühring (1878) que, com os trustes do final do século XIX, o mercado já dera lugar ao planejamento, agora é necessário levar a sério a suposição de que o Google, SAP ou Alibaba prefiguram uma organização econômica pós-capitalista. Em todo caso, é isso o que sugere Jack Ma, CEO da última empresa acima mencionada:

 

No último século, passamos a acreditar que a economia de mercado é o melhor sistema. Mas, na minha opinião, vamos testemunhar uma mudança significativa nas próximas três décadas. Eis que a economia planejada se tornará cada vez mais importante. Por quê? Porque por meio do acesso a vários tipos de dados, provavelmente seremos capazes de substituir a mão invisível do mercado (39).

 

Sem prejulgar a profundidade de tal possível modo de planejamento, deve-se pelo menos enfocar uma pluralidade de indicadores ecológicos e sociais capazes de delinear os constrangimentos livremente escolhidos, dentro dos quais a atividade econômica deve se movimentar, o que coloca em termos inéditos a questão de relações entre plano e democracia.

 

Uma planificação democrática no século XXI

 

Como diz Marx, é arriscado querer escrever receitas para as marmitas do futuro. Mas se quisermos ir além do capitalismo, tal como convida a crise em que estamos mergulhados desde 2008, é necessário questionar os contornos do sistema pelo qual queremos substituí-lo. O retorno crítico às experiências passadas e às teorias de planejamento será um elemento essencial de reflexão, mas esta última também terá que lidar com a questão democrática, com a teoria dos “bens comuns” e com a questão da propriedade, assim como com a questão das necessidades.

 

Um programa de trabalho dedicado ao planejamento no século XXI deve primeiro perguntar como tem sido o planejamento dentro do próprio capitalismo. A oposição entre o plano e o mercado é extrema por demais. Grandes corporações ou exércitos sempre planejaram. Em alguns países capitalistas avançados ou em desenvolvimento, o aparato estatal se responsabilizou em específico pelo planejamento na segunda metade do século XX (40). Este foi o caso do “Commissariat général au Plan” (que se tornou a estratégia da França, em 2013). E este ainda é o caso da China e de muitos países africanos onde houve um retorno à planificação já por cerca de quinze anos (41).

 

Ainda na França, o “Plano Monnet”, que cobriu os anos de 1947 a 1953, dizia respeito a seis setores: carvão, eletricidade, cimento, aço, maquinário agrícola e transporte. Fazia parte da reconstrução pós-guerra. Não se trata do mesmo tipo de planejamento que havia no bloco soviético, já que a propriedade privada e o mercado permaneceram aí estruturais. O planejamento foi chamado de “indicativo”. Em alguns países, como a Grã-Bretanha, esse aparato estatal originou-se de instituições criadas durante a guerra para administrar o racionamento. Mas desempenhou um papel estruturante na construção de um projeto de desenvolvimento nacional, como evidenciado por este trecho do discurso de 1961 do General de Gaulle sobre “a ardente obrigação do Plano”:

 

“O plano de desenvolvimento nacional deve tornar-se uma instituição essencial, mais poderosa em seus meios de ação, mais aberta à colaboração de organizações qualificadas de ciência, economia, tecnologia e trabalho. Que ela seja mais popular que o interesse sobre o seu trabalho seja despertado em todo o povo. É necessário que os objetivos sejam determinados pelo plano para todo o país e para cada uma de suas regiões, e que eles sejam fixados para a melhoria correlativa da condição de todas as categorias, primeiro dos mais modestos. É preciso que os investimentos públicos e privados sejam decididos para acelerar o ritmo do crescimento e que tudo isso se apresente como uma obrigação ardente para todos os franceses” (42).

 

O que é possível aprender com esses dispositivos para poder implementar um planejamento socialista no século XXI? Ele será apenas uma extensão do planejamento capitalista ou repousará em outra lógica? As novas tecnologias, que, como vimos, desempenham um papel central no planejamento futuro, nasceram dentro do capitalismo. Pode ser que o socialismo, tal como sugere a tendência “aceleracionista”, resulte da radicalização de tendências já existentes no sistema atual (43). Afinal, uma das suposições de Marx vê o socialismo como uma virtualidade presente no capitalismo tardio.

 

Por outro lado, o planejamento socialista pressupõe uma ruptura clara com a dinâmica da acumulação; advém de uma revolução que muda tanto aos fins quanto às modalidades da atividade econômica. Ora, isso implica uma mudança profunda na estrutura da propriedade, bem como na organização do trabalho e em seus propósitos, tal como veremos em breve.

 

Planificação e democracia

 

Uma segunda questão diz respeito à relação entre planejamento econômico e democracia. A proliferação de algoritmos contém um risco de violação das liberdades e de confisco da democracia (44). Se eles puderem ser colocados a serviço do planejamento, devem primeiro ser removidos do GAFA [isto é, do controle das empresas Google, Amazon, Facebook e Apple] e colocados sob controle democrático. Trata-se de “socializar os data centers“, como diz Evgeny Morozov (45).

 

Essa constatação está ligada a um problema recorrente das experiências passadas de planejamento. Historicamente, o planejamento centralizado não apenas falhou em suplantar o mercado como uma modalidade de coordenação econômica, mas também gerou estruturas políticas autoritárias. A teórica marxista dissidente húngara Agnès Heller emprega o termo “ditadura de necessidades” para descrever o regime soviético (46). Nesse regime, uma burocracia de planejadores apartados da sociedade civil determinava quais eram as necessidades “legítimas”, isto é, aquelas que o plano buscaria satisfazer, assim como as necessidades “ilegítimas”, as quais iriam permanecer insatisfeitas.

 

Isso criou para esses regimes um problema de legitimidade política, já que havia pouco consentimento da população. Um famoso provérbio da era soviética afirmava: “eles fingem que nos pagam e nós fingimos que trabalhamos”. Mas essa carência também afetava a qualidade das informações que a autoridade de planejamento era capaz de coletar. A coordenação era de cima para baixo, não de baixo para cima. Mas uma forma de participação ativa dos cidadãos é necessária se quisermos determinar as necessidades a serem atendidas e, assim, fixar as quantidades e as qualidades a serem produzidas. A participação tem também a virtude de motivar e capacitar os produtores, uma vez que a ausência de incentivos ao trabalho é um problema endêmico para os planejadores. A questão democrática aparece aqui, assim, misturada com considerações de eficiência econômica.

 

O planejamento é um problema inseparavelmente econômico e político. Atualmente, alguns cenários de transição ecológica tomam nota dessa dupla dimensão do planejamento. É o caso, por exemplo, daquele desenvolvido por Dominique Bourg, professor de ecologia política na Universidade de Lausanne (47). Segundo esse autor, as democracias representativas são, em essência, “míopes”, elas visam o curto prazo, isto é, são incapazes de enxergar no longo prazo. O ciclo democrático é o do mandato eletivo, que, conforme o país, é de quatro a oito anos. Mas as questões ambientais concernem (fortemente) o longo prazo. Isso explica por que as democracias até agora não conseguiram encontrar soluções para o problema da mudança climática.

 

Para resolver este problema, Bourg propõe a criação de uma “assembleia do futuro”, que se constituiria como uma terceira câmara que viesse, assim, a completar a câmara dos deputados e o senado. Esta assembleia ficaria encarregada de tudo o que diz respeito ao longo prazo e, particularmente, aos investimentos (maciços) relativos à transição ecológica. Alguns de seus membros seriam eleitos, mas outros seriam especialistas –por exemplo, climatologistas, e outros ainda seriam membros da sociedade civil. Ela funcionaria como uma espécie de “conselho econômico e social”, com poderes substantivos.

 

Se as empresas planejam hoje por meio de algoritmos, a transição para o planejamento da economia como um todo, como foi visto, não é algo auto evidente. A “assembleia do futuro” parece ser necessária para este aumento de escala. Ela sintetizaria as informações de diferentes setores da economia, permitindo a deliberação e a arbitragem sobre decisões de investimento e de alocação de recursos. Em suma, funcionaria como um “comissariado do plano” baseado em procedimentos democráticos, de tal modo que os interesses dos grupos sociais e das regiões estariam ali representados. No século XXI, o planejamento certamente resultará de alguma aliança entre algoritmos e uma “assembleia do futuro”.

 

Além dos “Comuns”

 

Em terceiro lugar, um programa dedicado ao planejamento deve abordar a questão da propriedade. Se o planejamento envolve controle político ex-ante da produção, os fatores de produção não podem permanecer em mãos privadas. De um jeito ou de outro, eles terão que ser socializados. Depois dos fracassos do planejamento no século XX, os socialistas voltaram à ideia de que apenas a propriedade estatal era virtuosa e, por isso, portadora de emancipação. O regime de propriedade que sustentará o planejamento futuro – cremos aqui – será misto, já que combinará propriedade estatal, cooperativa, “comum” e privada.

 

Um dos tópicos históricos desse debate é aquele do “socialismo de mercado”. Teóricos como Oskar Lange e Alec Nove viram nele uma alternativa ao planejamento centralizado (48). Certas formas de socialismo de mercado foram experimentadas na Iugoslávia, Hungria e na China, com vários graus de sucesso, dependendo do período. Nesse modo de produção algumas empresas são de propriedade do Estado. Assim, nessas empresas, o cálculo dos preços resulta de uma imitação do mecanismo de mercado, que é feita pelos planejadores. Este é o modelo desenvolvido por Lange.

 

Em outras formas, o socialismo de mercado combina propriedade coletiva – estatal ou cooperativa – dos meios de produção e descentralização. A competição existe entre unidades de produção. Estas são autônomas em termos de opções de gestão e de investimento. Investimentos estratégicos para a sociedade, no entanto, são decididos centralmente. Os preços também são assim decididos; porém, eles podem flutuar dependendo da circulação aparente – mas não em função de um excedente. Em alguns casos, existe um sistema de preço duplo.

 

O debate sobre o “socialismo de mercado” perdeu o vigor desde os anos 1980. Entre as controvérsias que animaram a esquerda nos últimos vinte anos, uma das principais focaliza os “Comuns”. Elas estão agora organizadas em torno das teses de Elior Ostrom, Prêmio Nobel de Economia. Na França, trabalham nesse tema Benjamin Coriat, Fabienne Ors, Pierre Dardot e Christian Laval (49). É interessante notar que existem alguns argumentos relacionados à descentralização da produção e a posição adotada em certas alternativas ao capitalismo (50).

 

O debate sobre os bens comuns pode ser assim resumido em termos gerais: além da propriedade privada e da propriedade do estado, ou entre o mercado e os serviços públicos, existe uma terceira lógica, irredutível às outras duas, que seria a dos comuns. Uma maneira de definir os bens comuns é dizer que eles são caracterizados pelo uso definido coletivamente e não pela lógica da apropriação, seja individual ou coletiva. Os comuns não são exclusivos, mesmo que sejam frequentemente rivais – entretanto, os “bens comuns intelectuais” não são disputáveis. Eles designam não tanto um tipo como um princípio, o qual Dardot e Laval chamam de “atividade em comum”. Os comuns visam sempre a produção coletiva de determinados valores de uso.

 

Uma das virtudes do debate sobre os bens comuns é que ele reviveu a reflexão sobre a natureza da propriedade, interrompida pela crise do marxismo e pela queda do bloco soviético no final do século XX. Uma questão subestimada pelos protagonistas desse debate, no entanto, é que a administração dos bens comuns implica planejamento. E isto é particularmente verdadeiro para o que Elinor Ostrom chama de “recursos disponíveis em comum” (common pool resources), tais como peixes, árvores, lençóis freáticos, etc, (51). Esses recursos não são exclusivos, pois não se pode em princípio excluir usuários potenciais; entretanto, são rivais: se uma pessoa come um peixe recém-pescado, isto impede que outra o faça. Além disso, na ausência de regulamentações, esses recursos provavelmente serão exauridos. Gerenciar os conflitos que resultam de seu uso requer uma “governança” – termo usado por Ostrom (52) – desses recursos, que inclui o planejamento de seu uso ao longo do tempo.

 

O problema da “autogestão” é um corolário que nasce nesse debate. O planejamento, como já foi dito, envolve alguma forma de controle democrático da produção. Esta é arrancada das garras das forças do mercado, para ser substituída por uma hierarquia política de escolhas sobre o que e como produzir. Mas isso significa dar aos produtores ou trabalhadores um privilégio em definir o que precisa ser produzido, como sugere a ideia de autogestão? Não são os cidadãos em geral – produtores e consumidores – que devem ter esse privilégio? Se a resposta for sim, então será preciso perguntar: em que contexto político?

 

No século XX, a autogestão tomou a forma de coletivos, tal como os conselhos de trabalhadores (em períodos revolucionários) ou as cooperativas (nos períodos normais) (53). Mas se o planejamento é responsabilidade de todos os cidadãos, como organizá-lo concretamente? Em uma base territorial, nos conselhos de bairro, por exemplo? Como esses conselhos se equiparão com as habilidades necessárias para fazer escolhas relativas à produção de bens e serviços? Os trabalhadores, em princípio, sabem apenas como produzir.

 

Além disso, como os cidadãos também são produtores, a questão do planejamento versa em parte sobre a organização do processo de trabalho. Isso levanta questões irredutíveis aos refinamentos do cálculo econômico permitido pelos algoritmos. A qualidade do trabalho requer que se deixe espaço para a expressão das energias subjetivas, individuais e coletivas, na atividade de produção. Somente se forem capazes de influenciar a organização de sua atividade profissional e de reconhecerem os seus propósitos, os indivíduos poderão desfrutar da satisfação no trabalho (54).

 

No entanto, longe de promover essa autorrealização no trabalho, a disseminação do uso da tecnologia da informação durante a era neoliberal resultou, para a maioria dos trabalhadores, em deterioração de sua atividade profissional. O poder das ferramentas digitais só pode contribuir para um projeto emancipatório se permitir que os próprios trabalhadores definam o objeto e a organização do seu trabalho. Deste ponto de vista, pensar no planejamento como um Comum pode ser um caminho frutífero, embora, até onde saibamos, este tópico tenha sido completamente inexplorado até o presente momento. De fato, uma das atrações da perspectiva dos Comuns é dar um lugar central à categoria de modo de uso, rejeitando assim a lacuna entre a produção e o consumo.

 

A sobriedade contra o produtivismo

 

O planejamento, finalmente, é inseparável de uma reflexão sobre a qualidade do que é produzido. Os bens do futuro devem ser projetados para serem duráveis, ou seja, não devem mais se submeter à lógica da obsolescência planejada característica do capitalismo. A escassez de recursos naturais e a multiplicação da poluição deixam pouca escolha. As demandas não são pequenas, basta nos lembrarmos de que um dos problemas do planejamento no século XX foi o desperdício, ou seja, a produção de bens que não atendiam a nenhuma necessidade. Na URSS, o desperdício e a escassez andaram de mãos dadas.

 

Marx e os marxistas foram muito criticados por causa do produtivismo. A “sociedade da abundância”, que prometeram e que deveria suceder ao capitalismo, é apresentada frequentemente como se supusesse um crescimento indefinido das forças produtivas. Não se pode negar que tal produtivismo existe em Marx e em muitos marxistas no século XX. Na Crítica do Programa de Gotha (1875), Marx diz, por exemplo:

 

“Numa fase superior da sociedade comunista, quando tiver sido eliminada a subordinação escravizadora dos indivíduos à divisão do trabalho e, com ela, a oposição entre trabalho intelectual e manual; quando o trabalho tiver deixado de ser mero meio de vida e tiver se tornado a primeira necessidade vital; quando, juntamente com o desenvolvimento multifacetado dos indivíduos, suas forças produtivas também tiverem crescido e todas as fontes de riqueza coletiva jorrarem em abundância, apenas então o estreito horizonte jurídico burguês poderá ser plenamente superado e a sociedade poderá escrever em sua bandeira: de cada um segundo suas capacidades, a cada um de acordo com suas necessidades!” (55).

 

Mas o que muitos comentaristas não viram é que, em Marx, o conceito de “abundância” não é definido apenas pelo lado da oferta. É determinado também pelo lado da demanda ou do uso. Para Marx, em última análise, não há utilidade senão para um consumidor. Consequentemente, a abundância e a escassez são relativas (56). A abundância pressupõe a sobriedade, um princípio de autolimitação da produção e, em nenhum caso, um desenvolvimento ilimitado das forças produtivas. Nesse sentido, por trás de qualquer discussão sobre produção, seja ela comercializada ou planejada, há uma discussão mais fundamental sobre o que precisa ser atendido. Isto é o que Marx quer dizer na famosa última frase desta passagem. Resta inventar um mecanismo político para determinar e reconciliar as necessidades de cada um…

 

 

 

 

 

(*) Cédric Durand é um jovem economista francês, professor associado na Universidade de Paris-13 e membro do Centre de recherche en économie da Universidade Paris-Nord. Ensina ainda teorias do desenvolvimento na École des hautes études en sciences sociales (EHESS). Suas pesquisas concentram-se na globalização, financeirização e mudanças no capitalismo contemporâneo. Faz parte da tradição da economia política marxista e regulacionista. É membro do conselho editorial da  Revue d’économie industrielle  e da revista online Contretemps. É autor de Le capitalisme est-il indépassable?, Éditions Textuel, Paris, 2010; En finir avec l’Europe, La Fabrique, Paris, 2013; Le Capital Fictif, Comment la finance s'approprie notre avenir, Les Prairies Ordinaires, Paris, 2014. Razmig Keucheyan é professor de Sociologia na Universidade de Bordeaux (Centre Émile Durkheim). Seu trabalho faz parte da tradição marxista clássica e contemporânea. É membro do conselho editorial das revistas Actuel Marx e Contretemps. O original deste artigo foi publicado na revista Actuel Marx. Esta tradução de Eleutério S. M. Prado surgiu em Outras Palavras.

 

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NOTAS:

 

(1) Veja-se a chamada no endereço: https://esra.nz/return-economic-planning-call-papers/.

 

(2) Thornhill, John, “The Big Data revolution can revive the planned economy”, Financial Times, 4 de setembro de 2017: https://www.ft.com/content/6250e4ec-8e68-11e7-9084-d0c17942ba93

 

(3) Um “megawatt” corresponde à economia de uma unidade de energia.

 

(4) Ver Association negaWatt, Manifeste négaWatt. En route vers la transition énergétique! Paris, Actes Sud, 2015, p. 91.

 

(5) Ibidem, p. 92.

 

(6) Ver Costanza, Robert, “Embodied energy and economic valuation”, Science, vol. 210 (4475), dezembro de 1980, pp. 1219-1224.

 

(7) Ver Arrow, Kenneth et al., “Are We Consuming Too Much?”, Journal of Economic Perspectives, 18 março de 2004, pp. 147-172.

 

(8) Marx, Karl, Le Capital, Livre 1, Puf, Paris, 2009 [1867], p. 90.

 

(9) Engels, Friedrich, L’Anti-Dühring (M. E. Dühring bouleverse la science) (1878), Paris, Editions sociales, 1950, p. 349.

 

(10) Ver Boukharine, Nicolas e Preobrajenski, Evgueni, ABC du communisme, Paris, Maspero, 1968.

 

(11) Asselain, Jean-Charles, “Comment le capitalisme a remporté le conflit du siècle”, in Bernard Chavance, Eric Magnin, Ramine, Motamed-Nejad e Sapir, Jacques, Capitalisme et Socialisme en perspective, Paris, La Decouverte, pp. 93-102.

 

(12) Samuelson, Paul A. e Nordhaus, William D., Economics, New York, McGraw-Hill, 1989, p. 837.

 

(13) Bettelheim, Charles, L’Industrialisation de l’URSS dans les années trente, Paris, Editions de l’EHESS, 1982.

 

(14) Robert, Allen, From Factory to Farm. A Reinterpretation of the Soviet Industrial Revolution, Princeton, Princeton University Press, 2003, p. 7.

 

(15) Wladimir, Andreff, La Crise des économies socialistes, Grenoble, PUG, 1993, pp. 275-322.

 

(16) Michael, Ellman, “Economic calculation in socialist economies”, in Eatwell John et al. (dir.), Problems of the planned economy, Londres, Macmillan, 1990, pp. 91-96.

 

(17) Ver Alec, Nove, L’Économie soviétique, Paris, Plon, 1963, pp. 198-214. Ver também Janos, Kornai, Le Système socialiste, Grenoble, PUG, 1996, pp. 183-188.

 

(18) Sapir, Jacques, “Le debat sur la nature de l’URSS”, in Ramine Motamed-Nejad, URSS et Russie rupture historique et continuité économique, Paris, Puf, 1997, pp. 98-99. Ver também Aglietta, Michel e Sapir, Jacques, “Inflation, penurie et l’interpretation des desequilibres dans les economies de type sovietique”, in Ivanter, Vladimir e Sapir, Jacques, Monnaie et Finances dans la transition en Russie, Paris, L’Harmattan/Editions de la Maison des Sciences de l’Homme, 1995, pp. 3-40.

 

(19) Bettelheim, Charles, Calcul économique et formes de propriété, Paris, Maspero, 1970.

 

(20) Ver Francis, Spufford, Red plenty. Inside the fifties’ soviet dream, Londres, Faber and Faber, 2010.

 

(21) Slava, Gerovitch, From newspeak to cyberspeak: a history of Soviet cybernetics, Cambridge MA, MIT Press, 2002, cap. 6.

 

(22) Eden, Medina, Le Projet Cybersyn: la cybernétique socialiste dans le Chili de Salvador Allende, Paris, Editions B2, 2017.

 

(23) Pache, Gilles et al., “Logistique et technologies disruptives dans les réseaux globalises de production: le role-clé des données massives”, Revue d’économie industrielle, 2019.

 

(24) Mario, Hermann; Tobias, Pentek; Boris, Otto – “Design principles for industries 4.0 scenarios”, 49th Hawaii International Conference on System Sciences, IEEE, 2016, pp. 3928-3937; Stan, Aronow; Ennis Kimberly, Jim, Romano – “The Gartner Supply Chain Top 25 for 2017”, Gartner Consulting, 24 de maio de 2017.

 

(25) Tyler, Welmans – “Blockchain and Crypto-Assets: leading toward a global barter economy?”, Financial Times, 19 de junho de 2018: https://www.ft.com/paidpost/DELOITTE/blockchain_and_cryptocurrency/index.html

 

(26) Thomas, Bocek et al. – “Blockchains everywhere: a use-case of blockchains in the pharma supply-chain”, IFIP/IEEE Symposium on Integrated Network and Service Management, IEEE, 2017, pp. 772-777; Kirstoffer, Francisco; David, Swanson – “The supply chain has no clothes: technology adoption of blockchain for supply chain transparency”, Logistics,, 2018/2, n° 1; Nir, Kshetri – “Blockchain’s roles in meeting key supply chain management objectives”, International Journal of Information Management, 2018, n° 38, pp. 80-89. Com agradecimentos a Emberton, Alex e a Befrage, Claes da Universidade de Liverpool por nos terem fornecidos essas referências.

 

(27) Binbin, Wang; Xiaoyan Li – “Big Data, Platform Economy and Market Competition. A Preliminary Construction of Plan-Oriented Market Economy System in the Information Era”, World Review of Political Economy, vol. 8, n° 2, 2017.

 

(28) Ver Dominique, Cardon, À quoi rêvent les algorithmes? Nos vies à l’heure des big data, Paris, Seuil, 2015, pp. 66-71.

 

(29) Joseph, Kaeser; Gross, Daniel – “Siemens CEO Joe Kaeser on the next industrial revolution”, Strategy and Business, 9 de fevereiro de 2016, URL: https://www.strategy-business.com/article/Siemens-CEO-Joe-Kaeser-on-the-Next-Industrial-Revolution?gko=efd41.

 

(30) Wilson, Marianne – “Wal-Mart Focuses on Speed, Innovation with SPA’s HANA Technology”, Chain Store Age, 6 mai 2015; Marr, B. – “Really Big Data At Walmart: Real-Time Insights From Their 40 + Petabyte Data Cloud”, Forbes, 23 de janeiro de 2017.

 

(31) Shannon, Bond – “Amazon’s ever-increasing power unnerves vendors”, in Financial Times, 20 de setembro de 2018: https://www.ft.com/content/c82ce968-bc8a-11e8-94b2-17176fbf93f5

 

(32) Joseph, Kane – “Mises Meets the Internet: Revisiting the Calculation Debate in Light of Recent Technology”, Social Science Research Network, 27 de fevereiro de 2016.

 

(33) Robbins, Lionel, The Great Depression (1934), Book for Libraries Press, Freeport, New York, 1971, p. 151.

 

(34) Vsevolod Pugachev, “Voprosy optimal’nogo planirovaniia narodnogo khoziaistvas pomoshch’iu edinoi gosudarstvennoi seti vychistel’ nykh tsentrov, Voprosy Ekonomiki, n° 7, 1964, pp. 93-103.

 

(35) Cottrell, Allin; Paul, Cockshott W. – “Calculation, complexity and planning: the socialist calculation debate one again”, Review of Political Economy, 5, n° 1, janeiro de 1993, pp. 73-112.

 

(36) Hodgson, Geoffrey – “Socialism against markets? A critique of two recent proposals 1998”, Economy and Society, vol. 27, n° 4, 998, pp. 407-433; Joseph, Kane – “Mises Meets the Internet: Revisiting the Calculation Debate in Light of Recent Technology”, op. cit.

 

(37) Amos, Tversky; Itamar, Simonson – “Context-dependent preferences”, Management Science, vol. 39, n° 10, octobre 1993, pp. 1179-1189.

 

(38) Ver Helene, Landemore, Democratic Reason. Politics, Collective Intelligence, and the Rule of the Many, Princeton, Princeton University Press, 2017.

 

(39) Citado em “Can big data help to resurrect the planned economy?”, Global Times, 14 de junho de 2017: http://www.globaltimes.cn/content/1051715.shtml Com agradecimento a Nathan Sperber por haver indicado esta citação.

 

(40) Ver Devine, Pat, Democracy and Economic Planning. The Political Economy of a Self-Governing Society, Polity Press, Londres, 1988, cap. 2; Christian Michel, Kot Sandrine et Matejka Ondrej (dir.), Planning in Cold War Europe. Competition, Cooperation, Circulations (1950s-1970s), Berlin, De Gruyter, 2018.

 

(41) Samuel, Boris, “Planifier en Afrique”, Politique africaine, vol. 145, n° 1, 2017, pp. 5-26.

 

(42) De Gaulle, Charles, Allocution televisee, 8 maio de 1961, disponível em: https://fresques.ina.fr/de-gaulle/fiche-media/Gaulle00072/allocution-du-8-mai-1961.html.

 

(43) Ver Mason, Paul, Postcapitalism. A guide to our future, Londres, Allen Lane, 2015.

 

(44) Ver Desmoulin-Canselier, Sonia, “L’emprise des algorithms”, La vie des idées, 20 juin 2018, disponível em: http://www.laviedesidees.fr/L-emprise-des-algorithmes.html.

 

(45) Ver Morozov, Evgeny, “Socialize the data centers!”, New Left Review, n° 91, janeiro e fevereiro de 2015.

 

(46) Ver Feher, Ferenc, Heller, Agnes e Markus, Gyorgy, Dictatorship over Needs, Oxford, Basil Blackwell, 1983.

 

(47) Ver Bourg, Dominique et al., Inventer la démocratie du xxie siècle. L’Assemblée citoyenne du futur, Paris, Les Liens qui Liberent/Fondation pour la nature et l’homme, 2017.

 

(48) Ver Nove, Alec, The Economics of Feasible Socialism, Londres, Routledge, 2010.

 

(49) Ver Rochfeld, Judith, Cornu, Marie, Orsi, Fabienne (dir.), Dictionnaire des biens communs, Paris, Puf, 2017.

 

(50) Ver Dardot, Pierre e Laval, Christian, Commun. Essai sur la révolution au xxie siècle, Paris, La Decouverte, 2014, e Coriat, Benjamin (dir.), Le Retour des communs. La crise de l’idéologie propriétaire, Paris, Les Liens qui liberent, 2015.

 

(51) Ver Orsi, Fabienne, “Reconquerir les communs: un enjeu determinant pour l’avenir des comuns”, Les Possibles, janvier 2015, p. 3.

 

(52) Ver Ostrom, Elinor, Governing the commons. The evolution of institutions for collective action, Cambridge University Press, Cambridge, 1991. Para uma síntese em francês da contribuição de Elinor Ostrom, ver Chanteau, Jean-Pierre, Coriat Benjamin, Labrousse Agnes e Orsi Fabienne (dir.), “Autour d’Ostrom: communs, droits de propriété et institutionnalisme methodologique”, Revue de la régulation, n° 14, outono de 2013.

 

(53) Para uma história das cooperativas, ver Borrits, Benoit, Au-delà de la propriété. Pour une économie des communs, Paris, La Decouverte, 2018, cap. 1.

 

(54) Coutrot, Thomas, Libérer le travail: pourquoi la gauche s’en moque et pourquoi ça doit changer, Paris, Le Seuil, 2018, cap. 6 e 7.

 

(55) Marx, Karl, Critique du programme de Gotha, disponível em: https://www.marxists.org/francais/marx/works/1875/05/18750500.htm

 

(56) Sobre esse ponto, ver Le Bec, Jean-Yves, “Abondance/Rareté”, in Georges Labica e Gerard Bensussan (dir.), Dictionnaire critique du marxisme, Paris, Puf, 2001, pp. 1-3.